São as nossas Chaves...
Olhas para mim e perguntas porque sorrio. Nesse instante desço à terra e apercebo-me que não cheguei a sair do sofá e permaneci na mesma posição por tempo indefenido. E eu, tão absorta, que julgara estar noutra época, noutro cenário, tal a intensidade com que presenciei os acontecimentos descritos.
Respondi-te de modo evasivo e voltei a embrenhar-me nas palavras. Daí a pouco o riso que aflorava os lábios era substituído pela lágrima que rolava pelo rosto. Dessa vez, olhaste-me mas nada disseste.
Li demoradamente as últimas páginas, como demoradamente lera as primeiras ainda que por razões completamente antagónicas. As primeiras, porque não me estava a ser fácil situar-me no tempo e no espaço e identificar-me com as personagens. Algo frequente quando se termina uma obra e se inicia outra com características diferentes. Por vezes, assumo o papel do narrador, outras sou uma personagem específica, e outras tantas, salto de personagem em personagem ocupando corpos, almas e mentes que tomo apenas por empréstimo. As últimas páginas, lias demoradamente por querer manter em mim a força das palavras traduzidas em emoções.
Não sou de partilhar excertos de textos pois cada um atribui diferentes significados a um mesmo símbolo. Desta vez, porém, não resisto a fazê-lo...
"(...) É essencial que nos expressemos. As paredes e as portas não impedem apenas o mal de entrar, mas também o bem. A nossa função é possuir as chaves da nossa liberdade, e ser capaz de usar essas portas. Passei muitos anos atrás de uma porta fechada sem saber onde encontrar a chave da minha vida, mas, graças à minha música, ando agora a encontrar uma via de saída. (...) «O que é a vida sem a beleza da arte, da música ou da poesia para nos ajudar a interpretá-la, nos incentivar a saber como sentir, como amar e como viver?» Na música, eu vejo as trevas, a luz, a confusão, a beleza e as complexidades da vida que não podem ser resumidas como numa equação. A música, para mim, ajuda a derrubar os muros, a abrir essas portas fechadas. E espero que esta noite também tenha sido assim para vós." (Suzanne Kelman in "Uma Janela com Vista sobre os Telhados")
E quem diz a música, diz a escrita, o canto, a dança, a tela em branco e todas as outras formas de arte com que nos expressamos e através das quais projetamos a nossa voz e a nossa identidade.
São as nossas Chaves...